Klingenthal, Alsácia, França

  A primeira impressão revelou uma pequena e pacata aldeia, na beira de uma estrada secundária, a caminho da montanha. Congratulou-se o viajante por ter trazido, para este recanto dos Vosges, a meia hora de Estrasburgo, com que se entreter. Alguma leitura depois, percebeu o viajante ter encontrado mais um daqueles sítios que foram importantíssimos num certo período histórico, mas já não o são, porque a razão específica daquele protagonismo deixou de existir.
Klingenthal é hoje em dia uma terreola pequena, de talvez uma ou duas centenas de habitantes. Apenas um ou dois dos seus edifícios se destacam, apesar de o conjunto da terra ter o charme habitual dos pequenos povoados franceses: entorno de arvoredo frondoso, ruas muito bem pavimentadas e arranjadas, casas antigas, mas em regra cuidadas. E vasos de flores por todo o lado.
Olhando o viajante com mais cuidado, conseguiu descobrir as memórias do tempo em que neste lugarejo existia uma enorme indústria de produção de armas brancas. O nome Klingenthal significa em alemão “o vale das lâminas” (e, recorde-se, a Alsácia saltitou, durante a história, entre a França e a Alemanha, guardando ainda muita herança das várias dominações germânicas). Este núcleo industrial, que floresceu durante os séculos XVIII e XIX, incluiu a Fábrica Real de Armas Brancas da Alsácia, também conhecida por Fábrica de Klingenthal. Aqui se implementou a produção em grande escala de armas, que desde o início do século XVIII abasteceu muitos dos exércitos europeus da época – incluindo, naturalmente, o Exército Real Francês.
O local foi escolhido por ficar num vale estreito, atravessado por um rio de abundante água, que garantia a energia para fazer funcionar os engenhos; por outro lado, as densas florestas das redondezas garantiam madeira para as casas e, sobretudo, para fabricar o carvão necessário às forjas. Além disso, Estrasburgo e o Reno não ficam longe e era portanto fácil criar canais de escoamento das armas.
  Esta fábrica foi criada em resultado das políticas de expansão industrial de Colbert, que instaurou várias Fábricas Reais que, além do título, tinham alguns privilégios. Também por isso, acabou por cair em declínio, quando as políticas mudaram - sobretudo, com o fim da monarquia, na Revolução. Em meados do século XIX deixou de ser Real e passou a ser propriedade privada. Deixou de fabricar espadas e sabres e passou a produzir utensílios agrícolas (sobretudo foices). Mais de um século depois, em 1962, as oficinas fecharam as portas.
Não se emocionou o viajante com o que descobriu destes tempos dourados de Klingenthal. Mas sempre foi tomando nota de algumas das antigas instalações. E ainda do pequeno museu local, que reúne um espólio especificamente dedicado ao passado industrial, exposto na Maison de la Manfacture, que fica no centro da aldeia.
De resto, valeu a pena a tranquilidade do lugar. No sopé das encostas verdejantes dos Vosges, propiciou agradáveis passeios pelos bosques e tempo descansado. Klingenthal tem uma pequena brasserie e um restaurante. Além disso, tem um típico hotel (Hotel des Vosges), modesto e familiar, mas confortável. A aldeia fica no coração da Alsácia. Vindo de carro, demora-se cerca de meia a partir de Estrasburgo. Ruma-se ao sul e deixa-se a auto-estrada na direcção de Obernai – daqui a Klingenthal são 5 quilómetros de estrada rural muito bonita.

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